Nos últimos dois anos, as 28 maiores montadoras do mundo viram seu caixa derreter. A queda no fluxo de caixa livre (free cash flow) acumulado foi de aproximadamente 75%, passando de um pico de US$ 144 bilhões (R$ 741,6 bilhões) em setembro de 2022 para apenas US$ 36 bilhões (R$ 185,4 bilhões) em dezembro de 2024. O número evidencia uma mudança drástica na saúde financeira de um setor que movimenta trilhões de dólares por ano. O motivo? Um volume sem precedentes de investimentos em eletrificação, software e plataformas digitais de mobilidade.
O que está acontecendo?
Empresas como Mercedes-Benz, Tesla, Toyota, GM, Volkswagen, Stellantis, BYD e Ford estão em meio a uma transformação estrutural que exige aportes bilionários em novas tecnologias. A corrida por veículos elétricos, soluções digitais e serviços de mobilidade conectada transformou as montadoras em verdadeiras empresas de tecnologia. Mas, como mostram os números, essa mudança está custando caro e ainda não trouxe retorno proporcional.
Segundo dados compilados por analistas de mercado e confirmados por relatórios financeiros das fabricantes, o fluxo de caixa livre combinado do setor caiu de US$ 144 bilhões (R$ 741,6 bilhões) no 3º trimestre de 2022 para US$ 36 bilhões (R$ 185,4 bilhões) no 4º trimestre de 2024. Embora tenha havido uma leve recuperação de 3% no último trimestre, o patamar atual ainda representa uma retração drástica em relação ao auge.

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O colapso do caixa, empresa por empresa
A Stellantis, uma das maiores montadoras do mundo, viu seu fluxo de caixa industrial cair cerca de €18,9 bilhões (R$ 120,8 bilhões) em 2024, segundo seu relatório oficial apresentado aos investidores. A empresa atribui essa queda à diminuição do lucro operacional e ao aumento expressivo dos investimentos em novos produtos elétricos e infraestrutura fabril.
A Ford é outro exemplo emblemático. A empresa acumulou perdas de US$ 9,7 bilhões (R$ 49,9 bilhões) entre 2023 e 2024 apenas em suas divisões de veículos elétricos e software. Um dos reflexos disso foi o cancelamento do projeto FNV4, uma nova arquitetura eletrônica que prometia rivalizar com a da Tesla. A montadora concluiu que os custos e os atrasos tornavam o projeto inviável, conforme noticiou a Agência Reutes.
Já a Tesla, referência global em veículos elétricos, viu sua margem de lucro operacional (NOPAT) cair de 13% em 2022 para apenas 5% em 2024, conforme análise publicada pela Forbes. A empresa ainda lidera o mercado de EVs, mas vem sofrendo com aumento da concorrência e queda de demanda em algumas regiões, principalmente, após o início do governo de Donald Trump, informa a Revista Forbes.
A corrida pelos trilhões do futuro
O pano de fundo dessa crise de caixa é uma transformação inevitável. A eletrificação da frota mundial é prioridade não apenas de governos e consumidores, mas também do mercado financeiro. A Volkswagen, por exemplo, anunciou que vai investir €52 bilhões (R$ 332,6 bilhões) em eletrificação e baterias até 2026.
A BMW, mesmo com investimentos robustos em eletrificação e digitalização, conseguiu gerar cerca de €5 bilhões (R$ 31,9 bilhões) em fluxo de caixa livre em 2024, demonstrando um pouco mais de equilíbrio financeiro, conforme está no BMW Group Report.
Um setor sob pressão
A indústria automotiva vive um dilema. De um lado, há a urgência em inovar. Do outro, os modelos de receita tradicionais estão perdendo força, e os novos (como serviços de software embarcado, mobilidade por assinatura e plataformas digitais) ainda não se consolidaram. Enquanto isso, o setor convive com margens apertadas e eficiência de capital em declínio.
Segundo análise da S&P Global, montadoras tradicionais estão sofrendo para competir com players nativos do ambiente digital, como Tesla e BYD.
A pressão aumenta diante de um cenário macroeconômico adverso, aponta a análise da PwC Auto Industry Trend. Juros elevados, inflação e instabilidades geopolíticas tornam mais caro o financiamento desses investimentos e reduzem a disposição do consumidor em adquirir novos veículos.
O que vem pela frente?
Apesar das dificuldades, montadoras como a Stellantis mantêm o otimismo. A empresa destacou que possui um balanço sólido e espera melhorar seus números à medida que os investimentos em eletrificação e software começarem a dar retorno, revelou a Morningstar, consultoria de investimentos.
Ainda assim, o setor como um todo enfrenta um momento de inflexão. A indústria automobilística está sendo redesenhada, e o capital está sendo drenado mais rapidamente do que os novos modelos de negócios conseguem compensar.
O futuro pertence às montadoras que conseguirem cruzar essa travessia com inteligência, tecnologia e, acima de tudo, fôlego financeiro.
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