sábado, julho 27, 2024
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Entrevista: especialista analisa impacto do PL “Combustível do Futuro” no Brasil

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A recente aprovação pela Câmara dos Deputados do projeto de lei do “Combustível do Futuro” no Brasil pode representar uma mudança significativa na transição energética do país.

Este projeto “Combustível do Futuro” visa integrar políticas públicas para promover o maior uso de biocombustíveis, como o biodiesel, feito a partir de plantas (óleos vegetais) ou animais (gordura animal) com a finalidade de substituir o óleo diesel fóssil utilizado em veículos comerciais, como caminhões, ônibus, furgões, vans de passageiros, entre outros.

A proposta inclui o aumento da mistura de biodiesel no diesel derivado de petróleo, a criação de programas nacionais para o “diesel verde”, além de elevar a mistura de etanol na gasolina.

O projeto sobre “Combustível do Futuro”, que agora segue para o Senado, foi um substitutivo do deputado Arnaldo Jardim para o Projeto de Lei nº 528/20, baseando-se no PL 4.516/23 do Poder Executivo. A iniciativa reflete um esforço coletivo para desenvolver a bioeconomia nacional, promover a indústria desses biocombustíveis para gerar emprego e renda.

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O consultor da RGF especialista em logística, infraestrutura e licitações, Ricardo Souza, é um estudioso do tema. O Frota News foi buscar um melhor entendimento técnico e as respectivas implicações do projeto “Combustível do Futuro”, assim como esclarecimentos sobre como anda o desenvolvimento do biodiesel no Brasil e no mundo, conversando com o especialista no tema.

FN: Antes de compreender por que efetivamente o biodiesel gera um debate tão intenso, gostaria de saber um pouco mais a respeito desse combustível verde. Quais pré-condições fortalecem a aposta nesse biocombustível no Brasil?

RS: Entendo que três fatores favorecem a aposta no biodiesel no Brasil:

– Como grande produtor de oleaginosas (por exemplo, soja) e carnes (principalmente bovina), o país possui disponibilidade de matéria-prima para a produção de biodiesel.

– O baixo nível de investimento, a modularidade das plantas de produção e o domínio da tecnologia tornam mais fácil e escalável o aumento de produção de biodiesel.

– Os modelos de comercialização e distribuição já definidos, sem grandes alterações na cadeia logística, também favorecem a aposta nesse biocombustível.

FN: Quais são essas matérias-primas?

RS: No Brasil, a produção de biodiesel tem como principais matérias-primas o óleo de soja e o sebo bovino, porém outras possibilidades são os óleos de girassol, amendoim, mamona, milho, dendê ou palma, entre outros.

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FN: Agora vamos falar sobre a implementação dessa mistura.

O Congresso Nacional aprovou a Lei n° 11.097, em 13 de janeiro de 2005, que tornou obrigatória a adição de 2% de biodiesel ao diesel (B2) até 2008. A Resolução nº 6/2009 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) aumentou para 5% o percentual obrigatório de mistura de biodiesel ao óleo diesel. Em 2017 foi aprovada a Lei nº 13.756 do Renovabio que junto à Resolução nº 16 de 2018 do CNPE ampliou a mistura par até 15% em 2023, porém o governo passado adiou a implantação desse aumento mantendo o patamar de 10% de mistura. Em 2023, com a alteração do governo central, o CNPE elevou a mistura para 14% de biodiesel no diesel a partir de 1º de abril de 2024, subindo para 15% um ano depois.

FN: As montadoras, e toda a cadeia abaixo delas, hoje já estão plenamente adaptadas a essa mistura?

RS: A Resolução CNPE nº 16, de 2018, que ampliou a mistura para o patamar atual com previsão de atingimento de mistura de 15% no diesel, passou à época por uma grande discussão e teve bastante resistência das montadoras e, principalmente, dos fornecedores de partes e peças de motores.

Essa resolução torna o Brasil o segundo país, além da Indonésia, a utilizar uma mistura obrigatória acima de B10 (10% de mistura), mas gera dificuldade em garantir o desempenho de longo prazo dos motores que utilizam essa mistura.

Além disso, apesar de a capacidade teórica instalada da indústria de biodiesel ser suficiente para atender à demanda projetada com B15, na prática vêm ocorrendo diversos problemas de qualidade no biodiesel a partir da implementação de misturas superiores à B10.

Aliado a isso está o fato de o biodiesel ser mais caro que o diesel mineral e contribuir para um aumento do preço na bomba. Isso fez com que o governo passado adiasse a implementação dos aumentos previstos na mistura, retornando para a utilização da B10.

FN: E, agora, com uma nova meta de elevação desse percentual e o aumento gradativo até 25%, como o senhor vê os preparativos das montadoras e dos parceiros de cadeia?

RS: Não vejo o governo atual ampliando o debate com as montadoras e sua cadeia de fornecedores de modo a termos garantias de que não teremos problemas com a implementação da B25 no curto prazo previsto no projeto de lei.

FN: Os aprendizados a partir do que ocorreu com a Resolução CNPE nº 16 podem ser úteis no futuro próximo devido ao aumento gradativo da mistura?

RS: Entendo que ampliar o debate e envolver mais as montadoras e seus fornecedores é essencial para o bom funcionamento do programa no futuro.

FN: Por que a discussão sobre o biodiesel vem ocupando tanto espaço na sociedade brasileira, diferentemente de outras soluções de energia limpa?

RS: Por ser uma tecnologia conhecida, já testada, de fácil implementação, com um investimento relativamente baixo e que trouxe bons resultados no passado. Além disso existe um grande lobby da associação dos produtores de óleo vegetal (Abiove) em favor desse tema.

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FN: Quais cadeias produtivas são impactadas com esse projeto “Combustível do Futuro”?

RS: Cadeias automotiva e de distribuição de combustíveis, cadeia de refino (pela redução da demanda de diesel) e cadeias de produção e de esmagamento de oleaginosas.

FN: A mistura vai requerer algum tipo de mudança ou adaptação dos players envolvidos? Quais?

RS: As principais mudanças estão na cadeia automotiva, principalmente na motorização e na garantia de longo prazo de funcionamento com a B25.

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FN: Quais são os gargalos que você identifica para a implementação da escala de misturas do projeto de lei dos “combustíveis do futuro”?

RS: Penso que temos três gargalos importantes:

  • Garantia de bom funcionamento dos motores com essa nova mistura — e estamos falando não apenas dos novos veículos pesados, mas de toda uma frota já existente e que está rodando.
  • Qualidade e preço do biodiesel produzido — a indústria tem que vencer os problemas de qualidade que ocorreram no passado, bem como garantir que a implementação da B25 não pese no bolso do caminhoneiro.
  • Fiscalização — caso o biodiesel continue com preços superiores ao diesel mineral, a ANP precisará reforçar a fiscalização da mistura obrigatória para evitar fraudes, que acabam distorcendo o mercado de distribuição de combustíveis.

FN: Vamos deixar de lado o projeto de lei para darmos uma olhada em como estão sendo implementados projetos similares no exterior. Quais países vêm adotando o biodiesel?

RS: Diversos países têm políticas de misturas de biocombustíveis (etanol ou biodiesel) obrigatórias, quer sejam com misturas definidas de etanol na gasolina, biodiesel no diesel ou mandatos gerais para todo o setor de transportes, que podem ser cumpridos de forma não uniforme em seus territórios nacionais. Entre eles estão os EUA, a União Europeia, Canadá, Colômbia, Equador, Argentina (outro grande produtor de biodiesel), Índia, Indonésia, Malásia e Uruguai.

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FN: Em linhas gerais, como vem sendo feita essa implementação?

RS: Falando especificamente de biodiesel, os mandatos variam muito, porém em geral ficam entre 5% e 10% de mistura.

FN: Pelo visto, então, não há similaridade com o projeto que vem sendo construído no Brasil?

RS: Não. O projeto brasileiro é muito mais ambicioso e obriga a mistura de forma horizontal em todo o território nacional.

FN: Quais vantagens e desvantagens você identifica no “Combustível do Futuro?

RS: O projeto busca a redução das emissões de gases do efeito estufa (GEE), o que é muito bom para o país. Ele tenta, também, trazer uma visão de planejamento do setor com a definição de marcos futuros de mistura, permitindo que o setor produtivo se prepare para a mudança a ser implementada.

As desvantagens estão na falta de discussão com a cadeia automotiva para termos garantias de não precisar de uma mudança de rota ao longo do percurso.

FN: Para finalizar, gostaria que nos desse um panorama sobre como visualiza o biodiesel nos próximos cinco anos no Brasil, suas tendências, consolidações e perspectivas.

RS: Visualizo a indústria de biodiesel como sendo uma das responsáveis pela redução de emissão de GEE no Brasil, com volumes crescentes de produção, quer sejam por ampliação da mistura ou por crescimento de consumo de diesel B (diesel já misturado com biodiesel), contribuindo para um fortalecimento da agroindústria nacional, com geração de empregos e impostos para o país.

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