Mesmo com os gestores públicos conscientes da importância do transporte entre centros produtores de bens, mais de 5.700 municípios e dezenas de mercados externos, o Brasil enfrenta uma série de desafios estruturais. Eles vão desde a precariedade da malha viária até a insegurança nas estradas e a constante instabilidade regulatória e econômica. À frente da Associação Nacional de Transporte de Cargas (ANATC), fundada em 2018, o presidente Elisandro Rodrigo Antunes tem buscado ampliar a representatividade do setor junto aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, defendendo maior diálogo institucional e ações coordenadas para enfrentar os gargalos que afetam diretamente a eficiência, a segurança e a sustentabilidade da atividade.
Em entrevista exclusiva, Antunes fala sobre os obstáculos cotidianos enfrentados pelas empresas transportadoras, a importância da união entre os agentes do setor, os avanços conquistados pela associação e os projetos para fortalecer ainda mais a atuação da ANATC como voz ativa nas decisões que moldam o futuro da logística nacional.
Os principais gargalos nas estradas brasileiras
Quais são os principais desafios enfrentados pelos transportadores de cargas rodoviárias no Brasil atualmente?
— São muitos os gargalos. Destaco alguns principais:
Infraestrutura rodoviária: Vivemos em um país continental, altamente dependente do transporte rodoviário, mas ainda carente de estradas com boa trafegabilidade. Em várias regiões, falta pavimentação, a manutenção preventiva é praticamente inexistente e a corretiva, muitas vezes, é feita de forma inadequada.
Segurança pública: A maior parte dos locais de descanso e pernoite é insalubre, e muitos trechos de rodovias são altamente vulneráveis a assaltos e outros tipos de violência.
Segurança jurídica, fiscal e tributária: A ausência de regras claras e as constantes mudanças criam um ambiente de alto risco, tornando o planejamento de longo prazo quase inviável.
Instabilidade econômica: Assim como em outros setores, a insegurança econômica — com variações em juros, câmbio, entre outros — impede que as empresas tenham previsibilidade para programar ações futuras.
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Representatividade como motor de transformação
Como a ANATC tem contribuído para a melhoria das políticas desse modal no país?
— A associação tem como missão principal apresentar a realidade diária dos transportadores aos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Ao dar voz aos associados para expor os desafios enfrentados nas estradas, a ANATC fornece subsídios para que as decisões desses três poderes estejam alinhadas com as necessidades reais do setor.
União como estratégia de fortalecimento
Qual é a importância da união dos transportadores de cargas para o desenvolvimento do setor?
— O transporte rodoviário abrange diversos segmentos dentro do mesmo setor. Por isso, é fundamental que existam políticas e estratégias bem direcionadas. A união, ao menos entre empresas do mesmo segmento, é essencial para que se conquistem avanços significativos. Acreditamos que o caminho é a cooperação e a organização coletiva.
Segurança nas estradas: uma prioridade urgente
Quais ações estão sendo tomadas pela associação para enfrentar os problemas de segurança no setor de transporte?
— Nossa principal frente de atuação nesse tema é a representação em Brasília, onde temos acesso direto aos diversos setores da segurança pública — como as Polícias Federal, Civil e Militar. Estamos em constante diálogo com essas instituições e também com o Judiciário, apresentando nossas dificuldades e mostrando a vulnerabilidade dos motoristas e veículos nas estradas. Ainda há muitos gargalos e uma segurança muito frágil, e queremos tornar isso visível às autoridades.
Sustentabilidade e associativismo caminhando juntos
Quais iniciativas a ANATC tem implementado para fortalecer a sustentabilidade no transporte de cargas?
— A simples existência de uma associação já é, por si só, um ato de fortalecimento e de busca pela sustentabilidade do setor. O associativismo cumpre esse papel, pois dá às empresas oportunidades de acesso a informações importantes — desde questões governamentais até temas empresariais de interesse coletivo. Reforçamos esse espírito de colaboração e construção conjunta como um dos nossos principais valores.
Participação ativa na criação de normas
Como a associação auxilia suas empresas associadas a se adaptarem às novas regulamentações do setor?
— A principal forma de atuação é participando desde o início da elaboração e do desenvolvimento das regulamentações. Isso evita que sejam criadas normas impossíveis de serem aplicadas na prática. Defendemos regulamentações eficazes, que ajudem a coibir desvios e que possam ser cumpridas com responsabilidade. Nossa presença nas discussões desde a origem das propostas é fundamental.
Agro e transporte: uma parceria que não tem fim
Qual é a visão da ANATC para o futuro do agronegócio brasileiro em relação ao transporte de cargas?
— O transporte rodoviário é essencial para todos os setores da economia, especialmente para o agronegócio, que é o grande motor da economia brasileira. Em um país continental como o nosso, é indispensável ter empresas de transporte fortes e sustentáveis para garantir o crescimento do agro. Essa interdependência entre transporte e produção agrícola é permanente — o ferroviário e o fluvial não chegam até as fazendas. Investir em infraestrutura, como estradas e portos, é melhorar todo o ecossistema.
Avanços e conquistas da ANATC
Quais são os maiores avanços que a associação conquistou desde sua fundação?
— Desde 2018, a ANATC tem feito um trabalho sério em defesa do mercado e de seus associados. Entre os avanços, destaco a participação na formulação de regulamentações, o apoio a instituições como o Instituto Brasil Logística (IBL) e nossa presença cada vez mais marcante no cenário nacional. Mas, acima de tudo, nosso maior feito tem sido promover a união dos associados — empresas que antes eram concorrentes e pouco se comunicavam hoje mantêm uma relação sólida e colaborativa dentro de um ambiente legal e organizado.
Mais diálogo entre entidades representativas
Em sua opinião, como a parceria entre os principais representantes do setor pode ser aprimorada?
— Assim como o nosso setor tem a ANATC, outros segmentos também têm suas associações, muitas delas até mais antigas e organizadas. Essa interdependência entre setores não vai acabar. Nenhum produto sai da indústria ou chega ao consumidor sem transporte. Somos elos de uma mesma corrente — se uma falha, tudo desanda. O aprimoramento dessas parcerias passa por diálogo, reconhecimento mútuo e presença ativa nas discussões. É preciso saber quais entidades representam cada setor, entender suas pautas e, principalmente, estar à mesa quando os assuntos estratégicos forem debatidos.
Expansão e voz mais ativa
Quais são os projetos futuros da ANATC para expandir sua atuação e impactar positivamente o setor de transporte?
— Nosso maior objetivo é ser cada vez mais a voz do transporte rodoviário de cargas junto aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, às agências reguladoras e à sociedade. Queremos expor nossas dores, mostrar o que fazemos de bom e escutar o que podemos melhorar em termos de representatividade. Com o tempo, acredito que vamos continuar nos fortalecendo e ampliando nosso impacto. Nosso compromisso é com um trabalho sério, técnico e ético, em prol de todo o setor.