terça-feira, novembro 5, 2024

Apagões de energia elétrica não deveriam ser normais. Precisamos conversar sobre isso!

Não temos que aceitar apagões como algo normal. Apagões podem matar e causam muitos prejuízos para a população! É necessário um debate transparente.

Primeiramente, vou me apresentar de forma bastante resumida (para os executivos da CEMIG). Sou jornalista nascido em BH, e moro em São Paulo há 23 anos, fui editor no jornal Jornal Hoje em Dia, assessor de imprensa da Fiat (atual Stellantis South America) e da TV Globo. Trabalhei 17 anos na filial de uma editora alemã (melhor escola da minha vida). Especializo em transição energética (eletromobilidade, biogás, biometano, mercado livre de energia, HVO e hidrogênio verde), em ESG e segurança viária para os setores de mobilidade de pessoas e cargas.

Sempre venho visitar minha mãe, principalmente neste período de final de ano, em Belo Horizonte. Minha mãe já está com 80 anos e tem problemas de saúde que a tornou dependente de oxigenação terapêutica domiciliar. Para que ela tenha este tratamento para continuar viva, ela depende de dois equipamentos. Esses equipamentos dependem de energia elétrica para funcionarem.

A realidade

Porém, no dia 25 de setembro teve um apagão no bairro que ela mora, o que fez com que ela ficasse sem oxigenação por mais de duas horas. Isso causou a descompensação apneica, que fez o coração trabalhar menos e encher os pulmões de líquidos (segundo os médicos que a atenderam). Chamamos o Samu e ela foi hospitalizada até o dia 29 de dezembro. Além do apagão do dia 25, ocorreram outros. Conversando com colegas jornalistas da Record Minas e da TV Globo Minas, e com ex-funcionários da Cemig, eles me orientaram a fazer um cadastro dela, com os laudos necessários, no site da Cemig, por haver uma necessidade de atendimento adequado, como são feitos para hospitais, clínicas e residências com pessoas que dependem de aparelhos eletrônicos para continuarem vivas.

Fiquei procurando em qual seção eu poderia fazer tal cadastro no site da Cemig. Eu me dediquei um bom tempo para achar essa seção e não encontrei. Pode ser porque o site da Cemig há excesso de informações publicitárias e de autopromoção e ele não tem uma navegabilidade fácil. Tentei ligar para o número 116, de atendimento ao cliente. Sem sucesso. O WhatsApp tem um chatbot que só saber responder perguntas óbvias, como pedir segunda via da conta de luz. Para perguntas mais complexas, pede para ligar para o 116, o mesmo número que ligo e não consigo ser atendido.

O site da Cemig descreve um mundo perfeito, como nos filmes “A Perfect World”, de Clint Eastwood; “O Pequeno Príncipe”, e diversos outros fantasiosos. Porém, a realidade é mais real do que a Cemig publica no site dela. Deve existir muita realidade no site da Cemig, mas com mistura com muitas inverdades, o que é difícil separar para quem não é cientista em comunicação.

Canais de atendimento que não funcionam

Então, estou usando o que aprendi com um diretor de pós-venda da Fiat: “quando um cliente expõe uma empresa publicamente, é porque os canais de atendimento da empresa falharam.” Uma das chefes do jornalismo da TV Record Minas enviou mensagem para um assessor de imprensa da Cemig e não teve resposta. Imagine, se a assessoria de imprensa da Cemig não responde a jornalista, coitado dos clientes. Em comunicação, chamamos isso de relacionamento de mão única.

Existem contradições entre a publicidade da Cemig com a realidade. Preciso de uma coisa muito simples: informação. Se a Cemig não atende bem jornalistas e nem ex-funcionários que me revelam os problemas da empresa (conversa de bastidores), e alguns não conseguiram trabalhar nela por muito tempo (como um ex-presidente e um diretor de comunicação que foram meus chefes na Fiat), é porque, realmente, a Cemig tem problemas. Tem alto faturamento graças ao monopólio, mas tem problemas acima da média de uma empresa privada com concorrentes.

Conversamos com o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG). Há dezenas de processos contra a Cemig, a maioria por causa da interrupção de energia, uma desobediência da Resolução Nº 1000 da Aneel, que entrou em vigor em 14 de fevereiro de 2022. É preciso contratar uma consultoria de advogados especializados para entender a resolução, de tão complexa que é. A norma é para a maioria dos cidadãos não entenderem nada. Uma parte foi possível entender: é dever da concessionária garantir o fornecimento contínuo e de qualidade de energia, entre diversas outras obrigações e, lógico, deveres dos clientes também.

Aí ficam algumas interrogações para a Cemig responder:

1. Ela aproveita a complexidade da norma para abusar dos cidadãos? 2. As multas que ela recebe são repassadas para as contas de luz do consumidor final? 3. Os custos dos advogados para defendê-la dos processos do MPMG. 4. Ela aproveita o monopólio para não investir nas soluções dos problemas? 5. Ela faz publicidade enganosa? 6. O MPMG chegou no limite dele? 7. O governador Zema pode fazer alguma coisa? 8. O Congresso Nacional pode mudar a legislação para acabar com o monopólio e acelerar o mercado livre de energia?

Que quiser ver os processos que o MPMG abriu contra a Cemig, o link é o seguinte para os processos extrajudiciais:

https://www.mpmg.mp.br/portal/menu/servicos/consulta-processual/procedimentos-extrajudiciais/?typeInstance=0&typeSearch=1&name=Cemig&number=

Para os processos Judiciais de 1ª e 2ª instâncias, o link é o seguinte:

https://www.mpmg.mp.br/portal/menu/servicos/diario-oficial/resultado-da-busca-de-noticias.shtml

Temos que cobrar, como sociedade, dos deputados federais e estaduais para acelerar o mercado livre de energia.

Duas décadas depois do início do século XXI, o crescimento dos apagões são normais? Óbvio que não. Essas concessionárias de energia pública, como Cemig, Enel e outras, faturam graças ao monopólio, a inércia dos clientes e dos órgãos reguladores, como a ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica.

A época dos orelhões

O que ocorre com o monopólio das concessionárias de energia elétrica me fez lembrar da época do monopólio de telecomunicação, quando a classe média alta e rica tinha telefone fixo e pobre comprava “fichinhas” para fazer ligação por “orelhão”. Quem nasceu depois dos anos 2000 não sabe o que é “orelhão”.

Hoje somos mais dependentes de energia elétrica do que quando a primeira hidroelétrica foi criada em 1882 na cidade de Appleton, nos Estados Unidos, aproveitando a queda d’água do rio Fox.

Se a Cemig não tiver uma comunicação transparente com a sociedade, apenas por meio de publicidade (que aceita mentiras), eu entenderei que a Cemig luta para manter o monopólio e é contra o mercado livre de energia, quando ela terá muitos concorrentes. Fico no aguardo de uma conversa sincera, pois nenhum canal de comunicação da empresa tem funcionado.

O conhecimento sobre o setor, eu acumulo há mais de três décadas. A coragem de começar a provocar um debate sobre a necessidade do fim do monopólio começou quando a população de São Paulo sofreu muito devido aos apagões (por dias e semanas) devido a uma tempestade em São Paulo, no dia 3 de outubro (garoa em comparação com as tempestades que ocorrem nos Estados Unidos, Japão e outros países), e o governador, diversos prefeitos, Ministério Público, Idec – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, imprensa em geral, e outras entidades começaram uma “guerra judicial” contra a Enel Group.

Presidente da Enel pede aposentadoria para não descascar o “abacaxi”

Após o prefeito de São Caetano do Sul pedir a prisão do presidente da Enel Brasil, este pediu aposentaria. Era óbvio que o “abacaxi” é muito grande para descascar. A Enel está tendo que enfrentar os governadores e centenas de prefeitos, e ministérios públicos dos estados em que atua. Ainda não sabemos quais serão as consequências dos apagões em São Paulo e Rio de Janeiro para a Enel e para os gestores públicos que permitiram o problema chegar a tal nível. Mas é óbvio que a Enel terá que pagar a conta, só não sabemos se terá dinheiro em caixa para uma conta tão alta.

Apagões são como aviões com pouco combustível

Aí, venho passar o Natal em Belo Horizonte, e a história se repete. A diferença entre São Paulo e Belo Horizonte, é que a imprensa, órgãos públicos, Ministério Público, governador e deputados paulistanos estão mais atuantes contra a Enel Brasil para ela dar respostas e soluções. A Cemig ainda vive em uma zona de conforto.

O que eu sinto em Minas Gerais, é que apagões são normais, como o assalto, e está tudo bem, faz parte da vida. É como faltar combustível em um avião para concluir um voo. Isso lembra o voo que matou 71 pessoas no voo da Lamia com o time Chapecoense por falta energia. O dono do avião achou que não precisa de garantir energia (combustível) suficiente para o avião chegar ao destino.

Eu não acho normal, não consigo ser inerte e por isso estou escrevendo vários artigos para explicar que apagões não são normais. A minha luta não é contra a Cemig, mas contra o monopólio da distribuição de energia elétrica.

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Marcos Villela Hochreiter
Marcos Villela Hochreiterhttps://www.frotanews.com.br
Atuo como jornalista no setor da mobilidade desde 1989 em diversas redações. Também nas áreas de comunicação da Fiat e da TV Globo, e depois como editor da revista Transporte Mundial por 22 anos, e diretor de redação de núcleo da Motor Press Brasil. Desde 2018, represento o Brasil no grupo do International Truck of the Year (IToY), associação de jornalistas de transporte rodoviário de 34 países. Desde 2021, também atuo como colaborador na Fabet (Fundação Adolpho Bósio de Educação no Transporte, entidade educacional sem fins lucrativos). Em 2023, fundei a plataforma de notícias de transporte e logística Frota News, com objetivo de focar nos temas que desafiam as soluções para gestão de frotas.
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