As picapes são as preferidas dos consumidores brasileiros e dos norte-americanos. O que diferencia é o modelo preferido (ou possível) no Hemisfério Sul e no Hemisfério Norte. Agora, vamos conhecer em mais detalhes as diferenças entre essas lideranças de mercado — diferenças que dizem tanto sobre os veículos quanto sobre os países onde eles circulam.
Vale ressaltar que não se trata de um comparativo entre marcas ou grupos — não é Ford contra Stellantis. A questão é bem mais profunda: é sobre o que cada montadora consegue entregar dentro da realidade econômica em que está inserida. E objetivo é mostrar os números dessas economias que refletem nas fichas técnicas dos veículos.
Nos Estados Unidos, um país com PIB estimado em US$ 30,5 trilhões (cerca de R$ 162,5 trilhões), há espaço para produtos maiores, mais potentes e tecnologicamente sofisticados, porque a renda per capita sustenta esse nível de consumo. Já no Brasil, com um PIB de R$ 9,4 trilhões, segundo a Fundação Getúlio Vargas, a lógica é outra: o mercado demanda eficiência, acessibilidade e versatilidade. Assim, as picapes líderes de cada país são, antes de tudo, reflexo fiel da economia que as sustenta.
Quando observamos a lista dos carros mais vendidos de 2025, a impressão é a de que Brasil e Estados Unidos vivem em planetas distintos. Lá, no norte, a Ford F-Series mantém sua hegemonia quase mítica, acumulando perto de 600 mil unidades vendidas até o terceiro trimestre. Aqui, abaixo da linha do Equador, a Fiat Strada reafirma sua popularidade com mais de 115 mil unidades no mesmo período graça às compras de frotas corporativas. As duas são picapes. Ambas são líderes. E, fora isso, nada mais é realmente parecido.
-
Leia também:
- Mercado de caminhões e ônibus: o que esperar de 2025–2026
- Toyota Hiace: a nova van como investimento estratégico para empreendedores

A F-150 — modelo que representa a maior parte das vendas da linha F-Series — é um colosso que nasceu para trabalhar pesado em um país feito de distâncias longas e estradas largas. Seus motores soam como hinos à abundância: o 5.0 V8 Coyote, o 3.5 EcoBoost híbrido, e o radical 5.2 V8 supercharged da Raptor R. São números que beiram o exagero, mas que fazem sentido onde rebocar barcos, trailers, máquinas agrícolas ou casas móveis é quase cotidiano. Em algumas regiões dos Estados Unidos, a F-150 não é apenas um veículo: é um kit de sobrevivência.
A poucos fusos horários de distância — mas em uma cultura automotiva completamente diferente — a Fiat Strada segue fiel ao princípio da praticidade. Com motores de 107 cv no 1.3 Firefly ou 130 cv no 1.0 turbo, ela não tenta impressionar pela potência. Sua missão é outra: ser econômica, resistente e suficientemente versátil para o pequeno empresário, o produtor agrícola, a frota urbana de entregas e a família que precisa conciliar orçamento apertado com funcionalidade. Enquanto a F-150 ostenta mais de 6 toneladas de capacidade de reboque, a Strada celebra seus 720 kg de carga útil, muito adequados à rotina brasileira.
Preços e tecnologias
Essa disparidade também se reflete no preço — talvez o ponto que melhor sintetize a diferença entre os hemisférios. Nos Estados Unidos, uma F-150 de entrada custa cerca de US$ 38 mil, perfeitamente compatível com a renda e o estilo de vida médio da classe trabalhadora. No Brasil, a Strada já parte de R$ 104 mil, número que exige esforço financeiro considerável de muitos compradores. E quando a própria F-150 desembarca no mercado brasileiro, ela assume de vez o papel de artigo de luxo: R$ 560 mil ou mais, dependendo da configuração.
Tecnologicamente, a comparação segue o mesmo roteiro. A F-150 oferece telas de 12 polegadas, câmeras 360 graus, piloto automático adaptativo, modos eletrônicos de reboque e até tomadas externas capazes de alimentar ferramentas — um recurso que transforma a picape em uma minioficina. Já a Strada se mantém na filosofia do essencial bem feito: central multimídia compacta, assistentes de segurança suficientes para o trânsito brasileiro e um conjunto construtivo pensado para durar mais do que impressionar.
No fim das contas, colocar as duas no mesmo campo de disputa seria como comparar uma locomotiva com uma bicicleta elétrica. Ambas movem pessoas e cargas, mas respondem a demandas completamente diferentes. A F-Series traduz o exagero funcional e cultural dos Estados Unidos, um país que pensa grande porque vive grande. A Strada traduz a habilidade brasileira de extrair o máximo de um pacote compacto, econômico e adaptado à realidade desafiadora das nossas ruas.
Cada uma lidera porque cada uma entrega exatamente o que seu país precisa ou pode — e talvez seja justamente por isso que ambas são campeãs absolutas.


