quinta-feira, novembro 21, 2024

Dia do Motorista: Comemorar ou continuar reflexão iniciada em 1896? 

Vamos, primeiro fazer esta reflexão. Imagina entrar em um avião e perguntar para o dono do avião:

“O seu piloto foi treinado?”

— “Não, mas foi indicado pelo filho da Lucrécia. É um menino muito bom, dedicado, honesto, tirou a carteira de piloto profissional de primeira e tem bom caráter”.

“Mas, seu piloto está descansado, dormiu bem, não está há horas trabalhando?”

— “Sim. Ele trabalhou só oito horas e, ele é muito bom, ele pode trabalhar mais umas quatro ou cinco horas, e ainda tirar o atraso na viagem”. “Entendi. Mas, pelo menos, ele se alimentou bem e está com os exames de saúde em dia”. “Ele se alimentou muito bem, comeu arroz, feijão e um coxão mole. Exames de saúde são feitos a cada cinco anos, e o último foi só há quatro anos”. 

Você voaria neste avião?  

Mas esta é a realidade para boa parte dos motoristas de caminhões, principalmente autônomos e agregados.  

Acompanho a evolução do setor de transportes há mais de 30 anos e há uma evolução, mas longe da desejável. Em alguns segmentos, temos grandes evoluções, pois há muitas transportadores e embarcadores que conseguem valorizar este profissional e investem, principalmente em treinamento. Mas não é a maioria. O que podemos fazer é refletir para melhorar. Há transportadoras tentando mudar essa realidade, mas barram em custos, valores de fretes que refletem no valor das mercadorias transportadas.  

Portanto, temos que analisar a questão com base em dados e fatos, pois só assim podemos buscar melhorias e, realmente, aumentar os motivos para comemorar o Dia do Motorista. Vamos entrar um pouco nesta questão, mas longe de esgotar o assunto, mas podemos quebrar alguns mitos. 

Quando lembramos do motorista 

Então, sem generalizar, os motoristas profissionais são lembrados em momentos específicos: quando faltam e a mercadoria não chega, quando atrasam e hoje. Em 25 de julho, o Brasil celebra o Dia do Motorista, uma data que homenageia esses profissionais essenciais para a economia e o cotidiano dos países. Embora o Dia do Caminhoneiro seja comemorado em outras duas datas – 30 de junho e 16 de setembro — 25 de julho também é o Dia de São Cristovão, padroeiro dos motoristas.   

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Portanto, a importância do motorista profissional para o mundo funcionar desde a formação das cidades e da economia em geral começou há 128 anos. Foi a partir da necessidade pela substituição do cocheiro pelo caminhoneiro.  

O caminhão foi criado em 1896 por Gottlieb Daimler, o que permitiu grandes mudanças econômicas no mundo. Desde então, a profissão de caminhoneiro começou e a necessidade deste profissional só cresceu, como de muitas outras profissionais. Não é uma competição de qual é a profissão mais importante, mas o Dia do Motorista e de reflexão neste dia.  

Desde a criação do caminhão, a humanidade ainda não inventou transporte mais eficiente, economicamente viável e democrático do que o veículo automotor sobre pneus. Há alternativas, mas economicamente inviável para a maioria da população.  

Não devemos desvalorizar os outros modais, pois cada um tem seu papel fundamental e a importância da intermodalidade faz crescer a eficiência do transporte. Os caminhões entregam cargas em 5.570 municípios e para cerca de 210 milhões de brasileiros. Os caminhões levam carga até os trens, navios e aviões, inclusive, o combustível para esses veículos funcionarem e é isso que faz a intermodalidade dar certo. 

A dependência do transporte rodoviário é global 

Pois é! Gostamos de dizer que “em um país de dimensões continentais como o Brasil, a dependência do transporte rodoviário é imensa, o que torna a profissão ainda mais crucial”. É uma verdade, assim como é verdade que os Estados Unidos, que tem a maior rede ferroviária do mundo, realizam mais de 77,4% do transporte de carga por caminhões. Tanto que, a frota de caminhões lá é 10 vezes maior do que a do Brasil. 

Também é verdade no Uruguai, Argentina, Mônaco, Inglaterra, França etc. Ou seja, para todos os países. A única exceção é o Vaticano que, mesmo assim, precisam que os caminhões levem tudo que é consumido lá dentro. 

Transporte nas 20 maiores economias do mundo 

Em novembro de 2022, eu fiz uma pesquisa sobre o uso do transporte rodoviário de carga nas 20 maiores economias no mundo. A saber, a pesquisa foi tendo como fonte o site do governo de cada país, estudos acadêmicos e entidades independentes do setor de transporte, como a CNT (Confederação Nacional do Transporte) no Brasil. Com base nos dados do PIB (Produto Interno Bruto) divulgados pelo FMI (Fundo Monetário Mundial) de 2022, temos a tabela abaixo: 

| Posição | País           | PIB em US$ trilhões | Participação do TRC | 

|———|—————-|———————|——–

| 1.º     | Estados Unidos | 22,998         | 77,4%                     

| 2.º     | China          | 17,458              | 80,0%

| 3.º     | Japão          | 4,937                | 90,0%               

| 4.º     | Alemanha       | 4,226             | 72,8%               

| 5.º     | Reino Unido    | 3,188             | 98%                  

| 6.º     | Índia          | 3,042                 | > 60%              

| 7.º     | França         | 2,935                | 89%                 

| 8.º     | Itália         | 2,101                  | 79,4%              

| 9.º     | Canadá         | 1,991               | 69,1%               

| 10.º    | Coreia do Sul | 1,799              | > 60%              

| 11.º    | Rússia         | 1,776                | 70%                 

| 12.º    | Austrália      | 1,633                | 77,4%              

| 13.º    | Brasil         | 1,608                  | > 61%             

| 14.º    | Irã            | 1,426                   | 79%                

| 15.º    | Espanha        | 1,426               | 71,6%             

| 16.º    | México         | 1,295                | 83,2%             

| 17.º    | Indonésia      | 1,186               | 70 – 80%        

| 18.º    | Países Baixos | 1,019               | 55,6%            

| 19.º    | Arábia Saudita | 0,834             | Dado não disponível 

| 20.º    | Suíça          | 0,813                 | 65,0%

Breve análise dos dados 

Dos 20 maiores PIBs do mundo, 18 países dependem mais do transporte rodoviário de cargas do que o Brasil e dois estão em percentual pouco abaixo do Brasil. A princípio, isso refuta a percepção comum de que o Brasil é excessivamente dependente do modal rodoviário em comparação com outras grandes economias. Países como os Estados Unidos, Reino Unido, Japão, França, entre outros, têm uma dependência muito maior das rodovias para o transporte de cargas. 

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O que isso significa para o Brasil? 

É claro que o Brasil enfrenta desafios significativos em termos de infraestrutura de transporte, incluindo a baixa porcentagem de estradas pavimentadas. No entanto, a dependência do modal rodoviário não é um problema exclusivo do Brasil, mas uma característica comum entre as maiores economias do mundo. 

O debate sobre a multimodalidade é relevante, pois a diversificação dos modais de transporte pode trazer benefícios econômicos e ambientais para as exportações brasileiras. Mas, para isso, é necessário um investimento significativo na formação de motoristas, em boas condições de trabalho, em infraestrutura etc. 

Dessa forma, os caminhoneiros precisam ser valorizados sem desvalorizar outros profissionais, pelo menos, como são valorizados os maquinistas de trens, comandantes de navios e pilotos de avião. Todos esses profissionais são importantes para os transportes, mas o caminhoneiro é o menos valorizado. Vários países no mundo estão com caminhões parados por falta de motoristas e o Brasil caminha para isso também, se nada não for feito

Diferentemente das economias mais evoluídas, o Brasil ainda não sofre grave falta de motoristas porque ainda não exigimos alto padrão de eficiência e segurança no momento da contratação do serviço de transporte. No Brasil ainda há a cultura de quanto menor o custo, melhor, independentemente da segurança. Isso explica — não tudo, mas principalmente —, a quantidade de acidentes nas estradas e diversos outros problemas de logísticas que temos.   

Quantas vezes vamos continuar repetindo os principais problemas que já conhecemos há anos? 

Certamente, condições de trabalho com longas jornadas, falta de pontos de descanso adequados e a pressão por prazos apertados são rotina para muitos motoristas. A insegurança nas rodovias brasileiras por diversas razões, a rotatividade de profissionais e ausência por problemas de saúde etc.  

Iniciativas e soluções 

Atualmente, há muitas iniciativas e soluções possíveis. Aqui no Frota News, trabalhamos incansavelmente para divulgar essas iniciativas para ser uma plataforma que reúna as informações dessas iniciativas para transformá-las em conhecimento.   

Conclusão 

Por fim, o Dia do Motorista é uma oportunidade para refletir sobre a importância dessa profissão e os desafios enfrentados por seus profissionais. Aliás, é essencial que a sociedade, o governo e as empresas reconheçam e valorizem o trabalho dos motoristas, implementando políticas e práticas que melhorem suas condições de trabalho e assegurem sua saúde e segurança. Por certo, neste 25 de julho, além de homenagear os motoristas, é momento de reforçar o compromisso com melhorias que tornem suas jornadas mais dignas e seguras. 

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Marcos Villela Hochreiter
Marcos Villela Hochreiterhttps://www.frotanews.com.br
Atuo como jornalista no setor da mobilidade desde 1989 em diversas redações. Também nas áreas de comunicação da Fiat e da TV Globo, e depois como editor da revista Transporte Mundial por 22 anos, e diretor de redação de núcleo da Motor Press Brasil. Desde 2018, represento o Brasil no grupo do International Truck of the Year (IToY), associação de jornalistas de transporte rodoviário de 34 países. Desde 2021, também atuo como colaborador na Fabet (Fundação Adolpho Bósio de Educação no Transporte, entidade educacional sem fins lucrativos). Em 2023, fundei a plataforma de notícias de transporte e logística Frota News, com objetivo de focar nos temas que desafiam as soluções para gestão de frotas.
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