Durante entrevista exclusiva aos jornalistas do International Truck of The Year, Luca Sra, presidente da Unidade de Negócios de Caminhões do Iveco Group, compartilhou a visão estratégica da companhia sobre o futuro da mobilidade sustentável, as parcerias internacionais e os caminhos tecnológicos que estão sendo trilhados para enfrentar os desafios da transição energética no setor de transportes pesados.
Transição energética com “sanidade”
Sra foi direto ao afirmar que a Iveco não vai abandonar o caminho da sustentabilidade, mas destacou a necessidade de equilíbrio e racionalidade na transição energética: “Traçar regras e legislar é uma coisa — estar tecnologicamente pronto é outra”, afirmou. Para ele, além da tecnologia, fatores como infraestrutura, ecossistema e oferta de energia são fundamentais para a viabilidade da mudança.
Ele acredita que veículos elétricos a bateria (BEVs) podem ter papel imediato em operações como mineração e distribuição regional, mas defende soluções variadas, incluindo biocombustíveis, para aplicações mais exigentes, como o transporte de longa distância.
Parceria estratégica com a Ford Otosan
Um dos pontos altos da conversa foi a parceria entre a Iveco e a turca Ford Otosan. O projeto, segundo Sra, busca “inovar na forma de cooperar” e visa dividir os custos de desenvolvimento, dobrar o poder de compra e acelerar avanços tecnológicos. “Vendemos cerca de 25 mil caminhões por ano cada uma, então juntos são 50 mil”, explicou.
O desenvolvimento da nova cabine está sendo liderado pela unidade de caminhões da Iveco, com apoio das áreas de tecnologia e digital. O projeto é dividido em partes iguais (50/50) entre as empresas e inclui o desenvolvimento conjunto da estrutura bruta (body-in-white), mas com diferenciações substanciais em powertrains e eletrônica.
Nova geração de cabines: conforto, modularidade e eficiência
A nova cabine, fruto da parceria, será modular, com versões diurna, estendida e “super sleeper”. No entanto, Sra adiantou que uma cabine de entrada baixa — comum em frotas urbanas e licitações públicas — não está nos planos imediatos.
Questionado sobre o conforto e espaço interno, Sra destacou dois pilares do projeto: valorização do motorista e eficiência aerodinâmica. “Estamos vendo uma escassez e envelhecimento da população de motoristas. Isso vai se tornar mais crítico. Precisamos atrair mais gente, inclusive mulheres e jovens”, afirmou. A aerodinâmica da nova cabine deve representar um ganho de 3 a 4% em eficiência, segundo projeções internas.

Multipropulsão e foco na diversidade energética
Embora a Iveco esteja avançando em veículos elétricos, Sra enfatizou que a meta não é ser “100% elétrica”, mas sim manter a liderança tecnológica em diversos tipos de propulsão. A empresa aposta em um portfólio que inclui diesel, gás natural, GNL, biocombustíveis, BEV e hidrogênio.
Neste contexto, o motor de combustão a hidrogênio aparece como uma aposta promissora. “É uma ideia inteligente e estamos tecnicamente prontos. Para longas distâncias, pode ser uma solução real — se houver fornecimento e infraestrutura adequados”, disse.
Legislação ambiental e paridade de custos
Sobre as multas impostas pela União Europeia a fabricantes que não atingirem as metas de redução de CO₂, Sra foi cauteloso, mas destacou um ponto crítico: “O que falta é paridade de TCO (custo total de propriedade). Precisamos de custos de energia competitivos por kWh ou kg de hidrogênio e alguma forma de equilíbrio com o diesel.”
Lições da parceria com a Nikola
Apesar das turbulências na parceria com a Nikola, Sra afirmou que a colaboração foi essencial para o avanço tecnológico da Iveco. “Foi um grande acelerador. Muito do que você vê no S-eWay e no eixo elétrico foi desenhado inicialmente para a Nikola”, revelou.
Ele também reforçou a importância do domínio de software para os novos veículos e destacou que a empresa vem se estruturando internamente para liderar neste campo, com plataformas cada vez mais definidas por software.
A entrevista com Luca Sra deixa claro que a Iveco está se posicionando como uma marca pragmática e versátil, disposta a liderar a transição energética sem perder a conexão com as demandas reais do mercado. Seja com novas parcerias, soluções modulares ou powertrains alternativos, a empresa aposta na inovação sustentável com foco em eficiência, colaboração e visão de longo prazo.


